quarta-feira, 3 de julho de 2013

DAFT PUNK

Enquanto o disco novo de Daft Punk não chega, a nossa retrospectiva explica o sucesso do grupo responsável pela revolução da house music






Talvez não se recordem, mas os resíduos das vossas lembranças mais superficiais atinentes à década de 1990 têm como banda sonora aquilo a que a crítica musical definiu como french touch, corrente musical francesa, protagonizada por grupos de música electrónica como Cassius ou Etienne de Crecy e cujos maiores representantes são os Daft Punk.
french touch, àquela altura, significou uma renovação num campo minado por fórmulas pasteurizadas pela febre Eurodance. Se nos Estados Unidos dos anos 90 o grunge significou revisitar sonoridades como o hardcore e o punk, na cena francesa o acid house e o disco foram os principais géneros responsáveis pela renovação musical que acontecia, numa época em que a cultura das drogas promovida pelas raves dava os seus últimos suspiros.
Os Daft Punk surgiram dentro deste contexto musical. Anónimos, criativos e nostálgicos, o duo apropriou-se das estruturas de géneros populares para se dissociarem do questionável trajecto dado à house music por grupos como Ace of Base, Technotronic e Fun Factory. Com phasers,samplers de disco music e beats em 4 x 4, Guy-Manuel de Homem-Christo e Thomas Bangalter integraram a presunção pelo reconhecimento da sua musicalidade pop com a cautela de um projecto cuja mais original e – aparentemente – contraditória proposta é preservar o anonimato dos seus idealizadores.
Com “Homework” (1997), a música electrónica parecia seguir um caminho mais honesto, a julgar pela boa recepção conferida ao álbum por publicações como Village Voice, Stylus Magazine e do crítico musical Alex Rayner, que colocou a estreia dos Daft Punk entre os maiores e mais influentes discos, no seu livro “1001 Albums You Must Hear Before You Die”.


O álbum, produzido integralmente nos estúdios caseiros do grupo, alcançou um grande sucesso de vendas, chegando a integrar o ranking de vendas da Billboard norte-americana e do Australian Albuns Chart. Recebeu disco de ouro, chegando a vender, somente nos Estados Unidos, mais de meio milhão de cópias. Uma nova era parecia anunciar o fim da Eurodance, soterrada por hits como «One More Time», «Alive» e «Around the Wold» (este último teve direito a videoclip dirigido pelo celebrado realizador Michel Gondry).
Em 2001, “Discovery” confirma a reinvenção do pop electrónico, num álbum coeso, fortemente influenciado pelo synth-pop; uma mudança que reconfigurou a sonoridade da banda, levando-a a caminhos distantes do disco, mas preservando a identidade sonora do duo francês no crepúsculo dos anos 2000.
Com “Discovery”, as transformações são bem mais agressivas, e o clima futurista chega às raias do rock electrónico, abusando dos vocoders e da plasticidade minimalista que caracterizou os álbuns anteriores. Considerado pelo duo o melhor de seus registos, “Discovery” obteve boa recepção, facto que se confirma pela nomeação ao Grammy na categoria de melhor disco dance.Singles como «Robot Rock» e «Technologic» (agraciado por um remix da canadense Peaches) e «Human After All» roubaram a atenção das pistas de dança nos quatro cantos do mundo, consolidando o sucesso de uma empreitada caracterizada pelo experimentalismo e pela improvisação do grupo.


O sucesso não parou: seja nas capas desenhadas pelo duo para as garrafas de Coca-Cola, seja assinando a banda sonora para remakes como “Tron”, o clima de mistério e fantasia que envolve a imagem do grupo é constantemente actualizado por aparições públicas, produções e parcerias com diversos artistas.
Este ano, o grupo ressurge com “Random Access Memories”. Carinhosamente baptizado de “RAM”, O álbum foi antecipado por um sem número de anúncios, vídeos publicitários e rumores que correram os quatro cantos do mundo. Do disco, pode-se esperar qualquer coisa, menos a previsibilidade.
Os motivos para essa previsão são vários: a dupla filiação do disco às gravadoras Sony Music e Columbia; o regresso do escritor e compositor Paul Williams; os 74 minutos de duração do álbum, divididos em 13 faixas já confirmadas e a presença do papa da disco musicGiorgio Moroder, declamando um monólogo em uma das canções. Outra personagem que marca presença em “Random Access Memories” é Nile Rodgers, figura importante na consolidação da cena disco norte-americana de 1970.



Se todos estes motivos não foram suficientes para deduzir que o que os Daft Punk trazem é bem ousado (nunca na trajectória do grupo, tantas participações foram contabilizadas), então o que resta é aguardar o dia 21 de Maio, data do lançamento oficial do álbum, que, vale a pena lembrar, já está em pré-venda no iTunes e no My Play Direct, nos formatos de vinil e CD.


Publicado no site Rua de BaixoEdição Nº91, Abril, 2013